(Des)Favor

....."A água fez o desfavor de faltar no exato momento da lavagem de uma pilha de roupas! E enquanto a mulher recolhia, de uma pequena bacia, algumas gotas do precioso líquido, para assim minimizar aquele inusitado, alguns pensamentos, também da pilha, voavam ora para perto, ora para longe...
.....Lançados às necessidades prévias do próprio existir, o ser humano, em maior ou menor grau, mostrava-se comandado por respostas a estímulos ádvenos, que incitavam, inclusos nestes, mais modificações no âmago. Não é fácil tirar sabão de uma blusa, usando-se água a conta gotas...
.....Todavia, como seria se cada um formatasse todo o comando da própria vida, exclusiva e minudentemente ao que se desejava? Deveras, precisar-se-ia de uma existência de milhares de anos, um equilíbrio sem par ao hoje e toda uma nova farmacologia. Não custa muito tempo para se aprender a lavar roupas. Demoraria, sim, o aprender a aprender a lavar...
.....O astro rei, naquele instante, protegido da ação humana, parecia se entremear entre nuvens sem qualquer convição de chuva, flocos de algodão cujo único intuito era o de passarem e, em algum lugar inevitável, despejarem-se livres, pesados, sem perguntas e sem respostas, apenas sensações... A chuva, de algodão em flocos, sente dor, mas não sofre; ela aprendeu a viver sem réplicas e já se cansou de implorar por contestações e tempestades. Não fosse tão forte, ela pararia de chover.
.....Ainda falta água e as roupas esperam; elas, não todos, foram instigadas à reflexão, não pelo que lhes é farto, mas pelo que lhes carece. É manhã de 26 de outubro de 2010; a cidade, onde o galo canta, sorri faceira. A água fez o favor de faltar..."